Em 5 meses de Governo, o Presidente do Brasil, Jair Bolsonaro, aprovou 14 medidas provisórias (MP), quase 3 por mês e mais de 160 decretos. Medidas Provisórias são uma espécie de lei, porém, feitas só pelo Presidente da República, sem a participação popular. Deveriam ser utilizadas somente em casos urgentes e relevantes. A própria Constituição Federal do Brasil, a Lei das Leis, prevê limites para a edição de regras desta forma, que podem ser ampliados pelo Congresso Nacional, segundo proposta que tramita no poder legislativo, responsável pelas leis.
As Medidas Provisórias publicadas pelo novo governo vão desde a abertura de crédito extraordinário para as finalidades que entende importantes, como os venezuelanos que vieram para o Brasil, até a alteração da CLT para vedar o desconto em folha da contribuição sindical. Até Código Civil, que também rege também o direito entre as empresas e pessoas, foi alterado.
Este tipo de expediente legislativo do Presidente é limitado porque depende do cumprimento dos requisitos para a sua manutenção e da posterior aprovação pelo Congresso Nacional, que é o poder competente para fazer as leis. O Presidente é eleito para cumprir e fazer cumprir as leis, que devem ser feitas mesmo pelo legislativo. Para fecharmos a tríade do Estado Democrático de Direito, ao Poder Judiciário cabe a missão de julgar se tudo está de acordo com as normas, que podem conflitar e muitas vezes são de difícil interpretação.
Assim, mesmo que as medidas sejam provisórias, é preciso conhecê-las, porque alteram as nossas relações sociais no dia a dia. Assim, segue uma brevíssima explicação de cada Medida Provisória publicada pelo Presidente até hoje (que por óbvio não dispensa uma leitura atenta dos seus textos na íntegra, porque também em matéria de lei, “o diabo mora nos detalhes”):
– MP 870, trata da organização do Poder Executivo Federal;
– MP 871, aprovada com alterações pelo Congresso, foi editada para alterar as regras de atuação do INSS no que tange às perícias, concessões e manutenções de benefícios;
– MP 872, trata de gratificações pelos servidores ou empregados requisitados pela Advocacia-Geral da União e sobre a cooperação federativa no âmbito da segurança pública;
– MP 873 altera a CLT para vedar o desconto em folha da contribuição sindical;
– MP 874, transfere créditos extraordinários para o Ministério da Cidadania;
– MP 875, para ajudar Brumadinho, em decorrência do vazamento de resíduos tóxicos pela Vale (antiga Vale do Rio Doce);
– MP 876, altera as regras de Registro Mercantil, estipulando que os contratos sociais e suas alterações devem ser registrados pela Junta Comercial entre 2 e 5 dias, sendo que as sociedades anônimas e as cooperativas continuam com tratamento diverso (aqui vale observar que no Estado do Rio de Janeiro, segundo a Junta e a Fazenda, em 24 horas a empresa pode registrar uma empresa e sair com o CNPJ e com a inscrição estadual);
– MP 877, tem um único e exclusivo fim, o de dispensar a retenção dos tributos na fonte sobre os pagamentos efetuados por órgãos ou entidades da administração pública federal, mediante a utilização do Cartão de Pagamento do Governo Federal – CPGF, no caso de compra de passagens aéreas diretamente das companhias aéreas prestadoras de serviços de transporte aéreo;
– MP 878, permite que o Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional – Iphan a prorrogação, até 28/6/2019, de 143 contratos por tempo determinado, mesmo que contrariamente a uma lei que não permitiria e continua em vigor;
– MP 879, permite o pagamento de despesas para as concessionárias de energia elétrica nos casos que especifica alterando a Lei nº 10438 que trata da matéria;
– MP 880, repassa R$ 223 milhões para o Ministério da Defesa utilizar em benefício dos venezuelanos, que vierem para o Brasil;
– MP 882, altera o Código Brasileiro de Trânsito e diversas leis brasileiras que tratam de empresas e políticas públicas (merece uma leitura muito atenta porque trará grandes impactos);
– MP 883, editada só para desautorizar a criação da empresa pública NAV Brasil Serviços de Navegação Aérea S.A.
Medida Provisória 881
Merece destaque, dada a grande repercussão, a MP 881, “da liberdade econômica”, que altera até o Código Civil Brasileiro, modificando todo o instituto jurídico da desconsideração da personalidade jurídica de uma empresa, quando há fraude ou desvios para responsabilização dos seus sócios.
Esta MP também é importante porque permitiu a empresa de responsabilidade limitada de um só sócio e a separação do patrimônio na empresa chamada de EIRELI, tipo empresarial que já possibilita apenas um sócio.
Chama a atenção ainda nesta MP 881, a possibilidade até de atividade informal, no caso da implementação, teste e oferta, gratuita ou não, de um novo produto ou serviço para um grupo privado e restrito de pessoas maiores e capazes. A própria norma excetua as hipóteses de segurança nacional, segurança pública, sanitária ou de saúde pública e determina o respeito à propriedade intelectual, mas abre uma porta para a informalidade das atividades empresariais.
Outro ponto desta medida que chama a atenção é a garantia de que os negócios jurídicos empresariais serão objeto de livre estipulação pelas partes, sendo o direito empresarial aplicável somente subsidiariamente ao combinado, ou seja, mesma que a lei não permita ou regule a matéria, vale o combinado entre os sócios.
Para abrir a possibilidade de uma atividade empresarial informal ou de fácil registro, a MP fala em “atividade de baixo risco”, mas deixa o conceito para regulamentação posterior pelo próprio Poder Executivo, ou pela legislação estadual.
Outro direito garantido pela MP 881, é que as solicitações de atos públicos de liberação da atividade econômica nela regulados terão a indicação de um prazo máximo de aprovação pelos órgãos públicos, que acaso ultrapassado, dará o direito de que a atividade seja considerada aprovada e regular. A norma, de forma geral, é confusa, razão pela qual espera-se que o Congresso Nacional, se não a rejeitar, até pela ausência do requisito da urgência, a aperfeiçoe.
161 Decretos Presidenciais
Além das medidas provisórias, o Presidente da República, já publicou, só nestes 5 meses de governo, mais de 160 decretos sobre os temas mais variados. Estes decretos só deveriam regulamentar as próprias leis, mas, como temos visto, e é o caso, por exemplo, do decreto que libera as armas, têm criado direitos e trazido mais obrigações “legais” (ou não), para todos os brasileiros e brasileiras, que ainda devem seguir a Constituição Federal (que já sofreu 99 reformas), com seus 250 artigos, mais 13.998 leis federais, 9.820 Decretos e 3.113 Medidas Provisórias, contando os dos ex-presidentes. Não estão nestas contas as leis e decretos estaduais, municipais, bem como as instruções normativas, orientações, resoluções e outras regras de todas as autoridades que impõe direitos e obrigações.
Assim, cumprir o princípio máximo, de que ninguém é obrigado a fazer ou deixar de fazer, senão em virtude de lei e não pode ser alegado o desconhecimento de nenhuma regra, é quase uma tarefa divina. Vale então refletir se a simplificação passa mesmo pela criação de mais regras ou só mesmo pela mudança da cultura e dos procedimentos administrativos dos órgãos públicos.
Cheryl Berno
Serviço
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