Cheryl Berno – advogada e conselheira da ACRJ
Houve nova polêmica na segunda audiência pública virtual, realizada pela Comissão de Tributação e a de Economia da Assembleia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro (Alerj) dia 8 de julho, em torno do texto enviado pelo governador Wilson Witzel (Projeto de Lei nº 2.772 de 2020), para os deputados aprovarem um novo incentivo fiscal para as grandes atacadistas. O novo Riolog, como é chamado o pacote de redução de ICMS, segundo o governo, é necessário para combater a Guerra Fiscal com o Espírito Santo, que em um programa similar, chamado de “Compete”, reduziu a alíquota do imposto sobre as mercadorias e alguns serviços, para 1,1% contra os 4% oferecidos atualmente pelo Rio às atacadistas enquadradas no regime especial para o setor.
A questão não é pacífica. Como representante da Associação Comercial do Rio de Janeiro (ACRJ), ressaltei a importância dos incentivos fiscais para todas as empresas, para que possam competir em pé de igualdade, inclusive as micro e pequenas. Segundo a Federação das Indústrias do Estado do Rio (Firjan), o novo incentivo fiscal inviabilizará as compras dentro do próprio estado do Rio, o que foi ratificado por representantes de outras entidades empresariais. O empresário Antonio Carlos Cordeiro, representante da Firjan, contestou a lei proposta, alegando que será extremamente prejudicial para as indústrias fluminenses e que os dados não demonstram benefício para o estado. “De acordo com o ranking da Associação Brasileira de Atacados e Distribuidores, realizado em 2019, o Rio de Janeiro arrecadou R$ 4 bilhões com o setor no último ano, ficando à frente do estado do Espírito Santo, que arrecadou R$ 2 bilhões. Já Minas Gerais e São Paulo lideram o ranking com R$ 16 bilhões e 12 bilhões de arrecadação, respectivamente”, disse Cordeiro ao questionar o fisco estadual e os deputados sobre o novo benefício em discussão.
A superintendente executiva da Associação de Atacadistas e Distribuidores do Rio de Janeiro (ADERJ), Ana Cristina Cerqueira, que defende o novo pacote de incentivos para as empresas do seu setor, considerou ao menos razoável dar um prazo maior para o fim do incentivo das indústrias, uma vez que a proposta prevê a revogação do Decreto nº 44.498, que atualmente permite que as indústrias podem ter o mesmo benefício das atacadistas, o que cai se a nova lei for aprovada.
O Deputado Luiz Paulo Correia da Rocha (PSDB), presidiu a audiência, que contou ainda com a presença dos deputados Eliomar Coelho (PSol), Martha Rocha (PDT), Gustavo Tutuca (MDB) e Waldeck Carneiro (PT). Uns defendem o novo incentivo e outros pedem mais dados. Diante das questões suscitadas, Luiz Paulo destacou que os incentivos fiscais já foram um grande problema e que os R$ 180 bilhões de redução do ICMS são números do Tribunal de Contas do Estado (TCE). Ele defendeu que essa matéria seja sempre tratada por lei e não por decretos, portarias e outras regras do próprio Executivo, para se tentar evitar o que houve no governo anterior.
No Governo Sérgio Cabral, o Ministério Público Estadual entrou na justiça contra os incentivos fiscais e chegou a conseguir uma decisão perante ao Tribunal de Justiça do Estado, exigindo que uma empresa e o ex-governador devolvessem mais de R$ 1 bilhão aos cofres públicos. “Essa prática gerou decreto a rodo e uma sonegação brutal”, afirmou Luiz Paulo, que defende o projeto enviado pelo governador, mas propôs alterações.
Rogério Dias Corrêa, que representou a Secretaria de Fazenda, defendeu o pacote de incentivos de Witzel, ressaltando que a indústria já usufrui do incentivo fiscal da Lei nº 6.979, conhecida também como “Lei Rosinha/Pezão/Cabral”, na qual as empresas pagam só 3%, mas vendem com um ICMS de 20%, com direito ao crédito do imposto, bem como entende que não haverá prejuízo para as micro e pequenas empresas porque essas já podem usar o Simples Nacional. Neste regime, a alíquota é variável, conforme tabelas anexas à Lei Complementar nº 123 (alíquotas de todos os tributos variam de 4% a 30% com dedução por faixa de receita) combinadas com a Lei Estadual nº 5.147, que traz alíquotas de ICMS de até 3,95%.
Com a nova regra em discussão na Alerj, as grandes atacadistas pagarão 1,1% de ICMS nas operações de compra de fora do estado com direito ao crédito e 12% nas vendas internas, já incluído o imposto da Substituição Tributária, que vem a ser o tributo devido até a venda ao consumidor final, cuja antecipação pelas indústrias, mesmo as do Simples, é exigida pelo fisco. Também está prevista no projeto em tramitação, a revogação total do Decreto nº 44.498, que permite o incentivo fiscal para as indústrias equipararem-se, para fins de redução do ICMS, às grandes atacadistas, que têm o desconto no imposto. Para se ter uma ideia da carga tributária estadual geral para quem não tem incentivo nenhum, a alíquota de ICMS no Estado do Rio varia de 20% a 37%, ficando em torno dos 34% para os serviços de internet, telefonia e energia elétrica.
Como o Ministério Público Estadual não estava representado nessa audiência pública, e alegou ter interesse no tema na última que participou, haverá uma reunião específica para a Fazenda apresentar os dados dos impactos aos cofres públicos ao promotor do MP envolvido no tema. Essa é a segunda audiência pública que a Alerj promove para debater o assunto. Na primeira reunião, os representantes dos setores leiteiros e de água mineral contestaram o Riolog e pediram ainda a retirada dos seus produtos do regime da substituição tributária, que obriga o recolhimento antecipado do ICMS.
Após as sugestões, será elaborado um projeto substitutivo ao apresentado pelo Executivo, que após votado pelos deputados, deve ser sancionado para entrar em vigor em setembro desse ano. Assim, as indústrias que utilizam o benefício dado pelo Decreto nº 44.498 e todas as demais, que não se enquadram nos requisitos do incentivo proposto, devem rever as suas operações levando em conta o novo cenário tributário no estado do Rio, que será mais vantajoso para as grandes atacadistas, mas pode prejudicar as demais empresas. Vale fazer as contas com antecedência para eventual revisão das operações.
Participaram ainda da reunião, o coordenador da Assessoria Fiscal da Alerj, o economista Mauro Osório, o conselheiro titular do Conselho Empresarial de Logística e Transporte da ACRJ, Henrique Mello, e a secretária-geral do Fórum da Alerj de Desenvolvimento Estratégico, Geiza Rocha, dentre outros representantes de entidades empresariais.
Para assistir a audiência na íntegra:
Para consultar o Projeto de Lei 2772: