As notícias recém divulgadas pelo IBGE sobre criação de empregos e postos de trabalho no País no segundo trimestre do ano são positivas. O desemprego caiu de 12,7% para 12%. O número de pessoas ocupadas aumentou em 1,5 milhão, o que não é pouco, embora 60% das vagas sejam informais. É provável que as reformas em andamento deflagrem o retorno de um crescimento razoável da economia e da oferta de trabalho.
Convém ressaltar, no entanto, que há um novo tipo de desemprego no ar. As raízes desse fenômeno são complexas e o Brasil não está sozinho.
O espectro do desemprego ronda o planeta e desafia estudiosos e pesquisadores.
Um grande serial killer de empregos é a chamada economia do conhecimento que se infiltra na atividade empresarial destruindo postos de trabalho com mais velocidade do que os cria, exigindo outros tipos de qualificação e revirando ao avesso o emprego tradicional.
Os impactos dessa nova economia no mercado de trabalho são fortes: metade das profissões hoje existentes desaparecerão no horizonte de uma geração.
O termo mais emblemático dessa nova era recebe o nome de GIG, nova modalidade de trabalho que cresce vertiginosamente nas economias desenvolvidas e se caracteriza por ausência de vínculo empregatício e de empregador, horários flexiveis de trabalho, possibilidade de trabalhar remotamente e atividades temporárias. É o trabalho independente ou auto-emprego (self-employment). Há, nesse contexto, um dado impressionante: praticamente todo o crescimento do emprego nos EUA após a recessão de 2008 foi do tipo GIG. O parlamento ingles recebeu recentemente um estudo que começa assim: “Gostem ou não, a economia GIG chegou”.
O outro fator disruptivo e destruidor de empregos é a robotização e a Inteligência Artificial (IA). Se o GIG muda a configuração do emprego tradicional, os robots e a IA o destroem. Pesquisas de uma renomada empresa internacional de consultoria indicam que mais de 30% dos postos de trabalho nos EUA serão substituídos por robôs ao longo da próxima década.
Há ainda uma terceira ameaça: a inteligência remota (IR). Os call centers que costumam empregar milhares de pessoas (a Índia é o maior exemplo) têm prazo de validade. Os softwares de voz (automated voice software-AVS) já têm desempenho melhor que os humanos. O mesmo pode ser dito sobre os softwares de tradução de idiomas (LTS – language translation software).
Com a IA e a IR, cirurgias e pareceres jurídicos, só para citar dois exemplos, poderão ser feitos por máquinas.
Um exemplo emblemático: nos EUA existem atualmente 3,5 milhões de motoristas de caminhão. É um atividade fundamental há um século. Ainda hoje há escassez de tais profissionais. É consenso, no entanto, que essa profissão é mais uma com “prazo de validade”. As montadoras e empresas de software vêm desenvolvendo, a passos largos, veículos que dirigem por conta própria. Nas cercanias de San Francisco circulam automóveis sem motoristas com tecnologia Apple. Nissan e Toyota prometem carros autônomos nas ruas de Tóquio já nas Olimpíadas de 2020.
A nova economia emprega menos e exige melhor qualificação. As habilidades mudam. Dois terços das crianças que entram atualmente nas escolas trabalharão em profissões que hoje não existem.
Outro subproduto dessa nova era é a dramática redução do comércio tradicional. Nos Estados Unidos, milhares de lojas de rua estão desaparecendo. Lojas tradicionais como Gap, Victoria’s Secret, Henry Bendel, Payless Shoes dentre outras estão fechando as portas. O novo comércio é eletrônico; compra-se tudo pela web. As novas lojas não têm empregados nem caixas registradoras. O consumidor, com o aplicativo em seu smartphone, é identificado visualmente ao entrar, escolhe seus produtos e vai embora. O valor das compras é debitado em sua conta.
Esses novos tempos são marcados pelas avaliações on line, os reviews. O motorista do Uber, o passeador de cachorros, o cuidador de idosos, o usuário do Airbnb, todos avaliam e são avaliados. É a “ditadura” do review!
Com a longevidade mais esticada, temos nesses novos tempos, três gerações presentes no mercado de trabalho, algo inédito na história. O número de trabalhadores idosos, entre 65 e 75 anos, nos EUA, cresceu 5% ao longo da última década. Boa notícia? Talvez, mas o idoso, muitas vezes, trabalha por necessidade, para complementar renda.
Nesse conturbado cenário, temos vantagens: o brasileiro tem gigantesca capacidade empreendedora. Ocupamos o terceiro lugar no ranking mundial de empreendedorismo. Mesmo aqueles a quem faltaram oportunidades razoáveis de ensino, tem pendor por empreender. Mais que isso, aquelas atividades artesanais como manicure, barbeiro, costureira entre outras, estão entre as de menor risco de substituição por robots.
A economia informal no Brasil, que conta hoje com quase 40 milhões de trabalhadores (incluídos os emprendedores informais) pode, por paradoxal que pareça, representar um facilitador para a adaptação do País à nova economia. Mas essa é uma matéria que está a exigir estudos e tratamento prioritário do governo, da academia e dos diversos atores na sociedade.
O espectro do desemprego assusta o mundo. Temos que enfrentá-lo no Brasil com vigor e muita criatividade.
Armando Mariante
Engenheiro e Membro do Conselho Superior da ACRJ