“State of Flux”. O termo em inglês representa um estado de incerteza sobre o que deveria ser feito, normalmente após algum evento importante, e precede o estabelecimento de uma nova direção de ação. Para o Diretor do Núcleo de Prospecção e Inteligência Internacional da Fundação Getulio Vargas (FGV), Renato Galvão Flôres Junior, em palestra para o Conselho de Política e Comércio Exterior da ACRJ, nesta quarta-feira, 19 de junho, o termo ilustra adequadamente o momento de incerteza pelo qual atravessa os BRICS, o bloco internacional que inclui Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul.
“Os BRICS se trata de algo inusitado, uma surpresa”, afirmou no começo de sua palestra, na qual contou a história de formação do bloco, desde a fagulha da ideia, ainda com o conceito de “países-baleia” em 2001, e com a criação do “BRIC”, até a entrada da África do Sul no bloco em 2010, quando o acrônimo atual foi adotado: BRICS.
Ótimo de Pareto
“Todos os países do grupo estão contentes por estar no Brics”, afirma Flôres Junior. De acordo com ele, a relação dos países com o bloco poderia ser definida como um “Ótimo de Pareto”. O conceito, desenvolvido pelo italiano Vilfredo Pareto, define um estado de alocação de recursos no qual é impossível realocá-los tal que a situação de qualquer participante seja melhorada sem piorar a situação individual de outro participante.
“A Rússia, normalmente relegada nas relações internacionais, é totalmente integrada no bloco. A China adora o grupo pois ainda pode se dar ao luxo de se posicionar como país em desenvolvimento. Ela pode tratar de seus problemas sociais que ainda a associam com essas economias, como o crescimento das favelas, por exemplo. O Brics é como uma alavanca para a Índia”, enumerou.
Para o caso do Brasil, segundo Flôres Junior, o país “cresce em importância, ao integrar um bloco no qual três países têm a bomba”. O mesmo motivo contempla a África do Sul, o único país africano do bloco. “Essa situação é uma das forças do bloco.”
Ele delineou o papel atual do Brasil em relação ao bloco internacional. “A meu ver, nossa política externa ainda não está completamente definida. Temos algumas coisas, como o realinhamento aos EUA. Ainda não sei o quão incondicional é essa posição”, afirma.
Apesar de identificar o receio entre as economias ocidentais em relação à ascensão chinesa, Flôres Junior afirma não compartilhar desse temor. “Há espaço para melhoras das relações com o país”, diz, complementando que parcerias de alta tecnologia com a China são desejáveis. No caso da Rússia, apesar de não representar um papel de investidor, como a China, ela está configurada como “um enorme mercado”a ser explorado pelo Brasil. “A Rússia é um mercado muito interessante para nós. Acho que até agora desprezamos”. Segundo ele, troca de tecnologia em setores específicos, como no setor militar, são estratégicas. Já a Índia pode ser um parceiro importante para a penetração maior do Brasil na Ásia.
Cúpula dos BRICS é momento em que diferenças são deixadas de lado
Outro aspecto importante, de acordo com o professor, é que as contendas entre os países – principalmente entre China, Rússia e Índia – são deixados de lado na cúpula do BRICS, em troca de debates e negociações amigáveis entre os países. “Estamos, dessa forma, em um ‘Ótimo de Pareto’, não vamos atrapalhar esta festa”, ressalta.
Outra visão, segundo ele, é de que os BRICS são uma potencial força de lobby no contexto internacional. “Há um esforço no grupo para se livrar da influência do dólar e do euro. A Rússia quer, por exemplo, desenvolver um cartão de crédito para ser usado entre os países do Brics”, diz.
Flôres Junior acredita que, apesar do momento econômico dos países do bloco ser diferente da época de sua fundação, com países como o Brasil em baixa e outros como a Índia em alta, o bloco possui peculiaridades e potenciais exclusivos. “Esse é um bloco único nas relações internacionais, pois une países não conectados geograficamente, e totalmente diferentes”, concluiu.