As urnas, em 2018, elegeram uma diversificada maioria de conservadores, liberais e social-democratas, e reafirmam uma trajetória econômica liberal inaugurada em 1990, que toma fôlego no mandato PSDB/DEM, descontinuada, pós-2002, até o impeachment.
Divergências há entre conservadorismo e liberalismo de costumes, acolhimento ou não de causas ambientais. Entretanto, convergem quanto à liberdade econômica, à desburocratização, à incapacidade investidora do Estado, à rejeição ao corporativismo e ao equilíbrio fiscal, urgente.
Converge-se, igualmente, na desoneração da folha salarial, imposição da concorrência global, da flexibilização das relações de trabalho, como Uber e Airbnb, ícones da “economia colaborativa”.
Assim, uma reforma tributária carece da articulação destas forças, ao largo de querelas partidárias, da divisão política do Brasil — desde 2014, radicalizada em 2018 — mesmo às vésperas do pleito municipal, pois as diferentes correntes devem respostas à crise que sufoca a nação.
Inteligência artificial, big data, criptomoedas, robótica, impressoras 3D, internet das coisas e nanotecnologia impactam a economia e a sociedade, tornando obsoletas regras e instituições jurídicas vigentes.
O comércio eletrônico, discos e CDs (agora streaming) e os softwares (antes em disquetes, CDs, DVDs, hoje na nuvem, em lojas virtuais e baixados pelo usuário) são emblemáticos. Os enormes desafios do Estado contemporâneo à luz de uma economia disruptiva, crescente no planeta, levam o princípio tributário da territorialidade a uma acelerada mitigação.
A reforma reclama princípios convergentes e deve ajustar-se à emergente “economia do conhecimento”, tendo como elemento catalítico, entidades empresariais, como a Associação Comercial do Rio de Janeiro.
Neste contexto, elencamos três princípios que, em nosso olhar, deveriam nortear a transformação do nosso sistema tributário:
1) A simplificação do sistema tributário brasileiro reduziria o gasto — hoje o dobro da média mundial em horas trabalhadas, segundo o Banco Mundial — necessário ao recolhimento de impostos. Indireta, mas concreta, redução da carga tributária, sem queda de arrecadação.
2) Descentralização da cobrança, com fixação de alíquota e coleta de tributo, autônoma, por cada unidade federada. Um mesmo fato econômico estabelece a obrigação tributária, em favor de cada um dos três entes federados, simultaneamente, preservada, entretanto, a competência arrecadatória de cada um, definida pelo domicílio da “transação”. Exemplificamos: a venda de um aparelho de TV, numa loja de eletrodomésticos, em Copacabana, seria fato gerador do “Imposto sobre Transações” alocado em percentuais diferenciados à União, ao estado e ao município.
3) Integração à economia digital, com unificação do fato gerador, do momento e do local de incidência, resguardada a autonomia tributária e exatora de cada ente federado.
Assim, a distinção entre licenciamento e venda de cópias de programas, bens tangíveis e intangíveis, mercadoria e serviço torna-se irrelevante, em vista da “transação”, como fato gerador único.
A transação em “nuvem”, por definição, não está delimitada a um espaço municipal, estadual, ou nacional. Portanto, a base territorial de tributação poderia estar calcada no domicílio societário, fiscal ou bancário do comprador, ou do vendedor.
Reiteramos: o mesmo fato econômico, o mesmo momento, o mesmo local, autonomia e independência na arrecadação ou exigência de cada unidade federada.
A otimização das alíquotas com vistas ao equilíbrio fiscal e a evitar encargos adicionais à sociedade deve, naturalmente, ser precedida por estimativas econométricas no Poder Executivo, assistido pelo Legislativo e a sociedade organizada.
* Artigo publicado originalmente em O Globo, em 30 de outubro de 2019
Angela Costa
Presidente da Associação Comercial do Rio de Janeiro