Artigos

Mário Quintana (poesia numa hora dessas?)

Mário Quintana (poesia numa hora dessas?)

Por Reinaldo Paes Barreto – membro do Conselho Empresarial de Cultura da ACRJ

Dia 30 de julho deveria ser feriado nacional: é a data em que nasceu (1906) no Alegrete, Rio Grande do Sul, o poeta da singeleza e do lirismo coloquial, Mário Quintana. Aos 20 anos foi morar em Porto Alegre aonde viveu o resto da vida. Morreu em 1994, aos 87 anos. Tentou entrar três vezes na Academia Brasileira de Letras, e três vezes perdeu a eleição. Na quarta, foi ele que não quis…

Em compensação, desabafou: todos estes que aí estão/atravancando o meu caminho/Eles passarão/Eu passarinho.”

Mario Quintana nunca se casou, nunca teve filhos, nunca teve uma casa “pra chamar e sua.” Morou no Hotel Majestic de 1968 a 1980, saiu de forma pouco elegante (por parte do hotel). Foi então para o Hotel Presidente por quatro anos de lá para Hotel Royal, do jogador Falcão, que o convidou para residir lá, sem custos e, finalmente, para o Porto Alegre Residence Hotel, aonde viveu a última década de sua vida.

Da Felicidade
Quantas vezes a gente, em busca da ventura,
Procede tal e qual o avozinho infeliz:
Em vão, por toda parte, os óculos procura
Tendo-os na ponta do nariz!

Mario Quintana foi muito mais do que (só) poeta: foi jornalista do Correio do Povo, com a sua coluna Caderno H; foi tradutor – traduziu Proust, Virgínia Woolf e Voltaire – dentre outros. E poetou muito.

Poema “Se for…”
Se for para esquentar, que seja o sol;
Se for para enganar, que seja o estômago;
Se for para chorar, que seja de alegria;
Se for para mentir, que seja a idade;
Se for para roubar, que se roube um beijo;
Se for para perder, que seja o medo;
Se for para cair, que seja na gandaia;
Se existir guerra, que seja de travesseiros;
Se existir fome, que seja de amor;
Se for para ser feliz, que seja o tempo todo!!

Mas além de poesia “oficial”, foi um maravilhoso fazedor de frases e pensamentos poético:

– “Se me esqueceres, só uma coisa, esquece-me bem devagarinho”

– “E de madrugada, o relógio da sala pergunta para o da cozinha: que horas são?” (Citação livre, não sei se exatamente)

– “A mentira (às vezes) é uma verdade que se esqueceu de acontecer…

Mario Quintana andava pelas ruas de Porto Alegre “catando poesia”; fumava bastante, bebia idem. Gostava de comida popular, mas também de lagosta. E de frutas. Escreveu muitos livros, ganhou os Prêmios Machado de Assis e Jabuti.

Obras

A Rua dos Cataventos (1940)

Canções (1945)

Sapato Florido (1947)

Espelho Mágico (1951)

Batalhão das Letras (1948)

O Aprendiz de Feiticeiro (1950)

Poesias (1962)

Pé de Pilão (1968)

Quintanares (1976)

Esconderijos do Tempo (1980)

Nova Antologia Poética (1982)

Nariz de Vidro (1984)

Baú de Espantos (1986)

Preparativos de Viagem (1987)

Velório sem Defunto (1990)

Finalizo com o seu poema mais famoso, talvez, que está no primeiro livro, de 1940:  A Rua dos Cataventos, que começa assim:

“Da vez primeira em que me assassinaram,
Perdi um jeito de sorrir que eu tinha.
Depois, a cada vez que me mataram,
Foram levando qualquer coisa minha”.

Mario Quintana morreu aos 87 anos, vítima de um AVC, mas nos deixou uma esperança de revê-lo: quando a gente morre, o outro mundo é este.

Reinaldo Paes Barreto também é assessor da diretoria executiva do INPI