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Vinho e meio ambiente

Vinho e meio ambiente

Por Reinaldo Paes Barreto – vice-presidente do Conselho Empresarial de Assuntos Culturais da ACRJ

O ciclo do vinho – da parreira à taça do consumidor – terá que passar por um quarto realinhamento com o seu (nosso) tempo. O primeiro, foi a saída das ânforas para a garrafa de 75 cl, com rolhas de cortiça; o segundo, o pulo “verde” para a produção de vinhos orgânicos; o terceiro, um audacioso passo ecológico: a produção de biodinâmicos. Este quarto movimento será enquadrar-se na moldura do conceito ESG, que em tradução simplificada expressa uma nova atitude empresarial: o responsável comprometimento com o Ambiental, Social e Governança.

Ou, seja, conectar objetivos interdependentes da cadeia produtiva, de forma a reformular a estrutura da empresa (vinícolas) e do consumidor (estabelecimentos comerciais e o usuário final).

De que maneira? Do ponto de vista ambiental, reduzindo o impacto que a produção acarreta ao meio ambiente pelo uso de fertilizantes e pesticidas, reduzindo a pegada do carbono (o vidro e o transporte), o desperdício hídrico e a gestão de resíduos. No social, maior atenção ao agricultor, “aos operários do vinho”, às suas famílias e às comunidades do entorno, aí incluída resumidamente uma política de respeito à diversidade de gêneros, direitos trabalhistas, segurança digital, alimentar e sanitária.

Mas algumas soluções não precisam ser (re)inventadas, porque já existem – e funcionam.  A primeira delas, é a produção de vinhos Orgânicos. São aqueles cujas uvas foram cortadas de parreiras sobre as quais não se usaram agrotóxicos, herbicidas, pesticidas e outras químicas, para combater as pragas, e corrigir o solo. Tanto assim, que no cultivo de vinhas orgânicas, as ervas daninhas que crescem ao lado do parreiral são comidas por gansos e usam-se vespas para combater as aranhas que furam as uvas, além do retorno à praticas testadas pela “sabedoria da Terra”: plantar os parreirais nas encostas que dão para o leste, (o sol da manhã é bactericida), cultivar rosas na ponta das fileiras, porque a praga as ataca primeiro, acendendo o sinal amarelo, etc.

A segunda e mais radical, é a produção de vinhos Biodinâmicos. Eles são produtos de parreiras cujo cultivo é quase místico, porque esses “poetas da vinha” não abraçam só um sistema de produção agrícola, mas uma filosofia de vida, segundo a qual — como na moderna medicina — o projeto existencial deve se orientar para a prevenção e não para a doença. E o lado exótico, (bizarro, como diriam os meus netos) é que o modelo biodinâmico de produção agrícola obedece à influência de forças cósmicas, em especial da Lua e do Sol para determinar os movimentos e o “timing” do ciclo produtivo do vinho: plantio, poda, fertilização, colheita, vinificação e engarrafamento. Na seca, utilizam-se algas marinhas; nas floradas, arnica; na “doença”, homeopatia.

E mais: em célebres vinícolas como “La Domaine de La Romanée Conti, na Borgonha; em Montalcino, na Toscana e – sim senhores! – no Vale dos Vinhedos, na serra gaúcha, a plantação de uvas reage feliz ao repertório clássico de Mozart e Debussy, em composições escolhidas para serem executadas por cordas e piano, já que óperas e grandes orquestras estressam o parreiral.

Finalmente, falta agregar o elo que precisa ser melhor trabalhado: o consumidor final, para que responda à essa revolução com o seu exemplo, a sua firmeza na escolha (e exclusão) da origem dos vinhos e um criterioso consumo da bebida.

Só assim poderemos sonhar com a continuação limpa, sadia e prazerosa desse produto bíblico – o vinho — que junto com o linho, o trigo e a oliveira vêm atravessando os séculos na taça de nossos avós, pais, filhos, netos, bisnetos — e há de brilhar no cacho de uvas que vai nascer generoso e correto — no ano 3000.

Reinaldo Paes Barreto também é assessor do INPI e Embaixador do Turismo-Rio