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O fantasma da renda média

O fantasma da renda média

Por Fernando Travassos – diretor da ACRJ

Seguidamente nos deparamos com observações sobre o Brasil ser um país de renda média. De fato, em termos de renda per capita, levando-se em conta os dados em dólares ajustados pelo poder de paridade de compra, estamos no nível de $16.100 anuais (Banco Mundial 2021), junto com países como a China ($19.300), México ($20.000), Argentina ($23.600), Uruguai ($24.600). Trata-se de um nível intermediário entre rendas inferiores a $12.000 anuais e as de países como Estados Unidos ($69.300), Alemanha ($57.900), Canadá ($52.100), França ($50,700), Reino Unido ($49.700), Itália ($45.900) e Japão ($42,900), para citar economias complexas, com grande população e/ou extensão territorial.

A chamada “armadilha da renda média” refere-se à dificuldade que as economias encontram em galgar rendas per capita mais elevadas a partir de um nível médio de renda alcançado. Além da concorrência implícita por mercados, tecnologia e fatores geopolíticos, os países de renda média enfrentam o desafio de aumentar sua produtividade geral – trabalho, energia, insumos etc. – a chamada produtividade total dos fatores de produção. Há que se reduzir o desnível tecnológico do setor produtivo e o da qualidade da mão de obra. Os desafios abarcam também o ambiente de negócios, prejudicado principalmente pela burocracia, interferência governamental excessiva, corrupção e por sistemas jurídico-processuais demasiadamente reféns de influências culturais, políticas e ideológicas.

Os países muito populosos e com grande extensão territorial, como Brasil, China e Índia, por exemplo, enfrentam dificuldades adicionais devido às complexas tarefas de planejamento e gerência de tão robustos e vastos ativos. Por outro lado, representam grandes mercados, atraindo investimentos internos e externos, dependendo das condições, já referidas, ligadas ao ambiente de negócios.

No caso do Brasil, mesmo estando na categoria de “país de renda média”, há uma trajetória longa, mas possível, de se atingir pelo menos a renda per capita de Portugal, Polônia ou Hungria, por exemplo, em torno de $ 37.000 anuais. Seria necessário um crescimento médio do PIB de 5,0% anuais ao longo dos próximos 20 anos, considerando-se a hipótese otimista de uma expansão populacional média em torno de 0,7% ao ano, hoje no nível de 0,75%.  É um processo bastante desafiador para um país que experimentou um crescimento médio anual de 1,83% de sua renda per capita nos últimos 40 anos (1980-2020) e de 1,23% anual médio nos últimos 20 anos (2000- 2020).

Paralelamente a esse esforço de crescimento, ainda há muito a ser feito pelo país. Como reduzir a disparidade de renda em sua população; aprimorar o seu aparato jurídico e institucional, tornando-o mais efetivo e menos formal; baixar o nível de corrupção nas relações entre o governo e os agentes econômicos, vencendo as poderosas forças incumbentes; e diminuir a burocracia na administração pública, afastando os agentes que com ela se locupletam, aumentando, consequentemente, sua produtividade geral. Em qualquer caso, mesmo se tal não ocorrer, o Brasil sempre será uma economia magna em termos absolutos, com grande mercado consumidor, atraindo agentes de toda espécie em busca de retornos de seus investimentos.

Fernando Cariola Travassos, Doutor em Economia (USP), pesquisador visitante da Universidade de Columbia N.Y. e diretor e membro do Conselho Empresarial de Políticas Econômicas da ACRJ