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Como fazer cultura

Como fazer cultura

A cada vez que reflito sobre as desditas por que passa a cultura nesta cidade não há como deixar de me inquietar.

E quando me refiro à cultura, devo logo sublinhar que meu entendimento de qualquer processo cultural será sempre transversal, abrangente. 

Não há como pensar em editar livro sem leitores adestrados a entendê-lo. Construir teatros sem formação de platéia. Fazer filmes sem locais para exibi-los. Ou erguer museus sem visitantes.

No Rio, qualquer esboço para se agilizarem ações efetivas em benefício da cultura não deve contar com os órgãos públicos. Porque falidos, quando não, desinteressados. Quase sempre incapazes de compreender a grandeza da arte do povo, fato especialmente doloroso em uma cidade solar, libertária, livre de preconceitos como a nossa.

Nem me detenho nos detalhes que me irritam sobremaneira, como a falta de visão sobre o carnaval e os folguedos populares.

Paro por aqui o meu desabafo. Até porque há uma outra face da moeda. Que consola e nos faz acreditar na cidadania.

Os mecenas existem no Rio, e despontam de organismos particulares. Já comentei aqui os benefícios do SESC, que funciona no Brasil como um Ministério da Cultura ativo e certeiro.

Refiro-me agora ao Cesgranrio, uma instituição que poderia limitar-se apenas aos vestibulares. Qual o quê. Há dias me encantei com a entrega do Prêmio Cesgranrio para Teatro, um evento de congraçamento para (no mínimo) a sustentação da auto-estima dos nossos atores/atrizes/diretores.

Na festa irretocável, o criador dos Prêmios e presidente da instituição, o Prof. Carlos Alberto Serpa, mostrou o dedo do gigante, e provou por A mais B como o mecenato pode fomentar idéias e fazer a gestão cultural, substituindo com vantagem órgãos oficiais.

Serpa destilou uma programação de ações de dar água na boca. Anunciou a criação de dois novos teatros no Rio Comprido, aonde fica a sede (suntuosa, por sinal) do Cesgranrio. Anunciou os novíssimos Prêmio Rio de Literatura e de Dança (sim, a dança que jamais foi contemplada). Anunciou a criação de Oficina de Atores, além de outros projetos muito originais como Música Erudita nas Escolas Públicas, Orquestra Sinfônica Cesgranrio, Oficinas de Cinema para produzir vídeos históricos destinados às escolas. Anunciou, por fim, a criação da Faculdade de Teatro e do Instituto Cultural Cesgranrio. 

Terminou suas pérolas com um toque de mestre, um mestre refinado a preservar a memória do povo de teatro: a criação da edição de livros sobre os maiores atores do Brasil, começando com a biografia da diva absoluta Bibi Ferreira, já aos 96 anos de idade. Os aplausos choveram com razão.

Ali estava o Serpa a proclamar uma súmula de idéias e de realizações de tirar o fôlego. Um homem simples, sem pose majestática, a fazer (sem querer, mas fazendo) o papel individual dos secretários de cultura com que todos sonhamos. E jamais tivemos.

Ricardo Cravo Albin
Presidente do Conselho Empresarial de Assuntos Culturais da ACRJ