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Mercado financeiro no Brasil: arroz de patos no jantar

Mercado financeiro no Brasil: arroz de patos no jantar

Quem acompanha a atividade financeira mundial sabe muito bem que aplicar dinheiro na Nigéria pode ser um grande negócio. Mas pode se perder tudo, de repente. Há de saber também que, aplicando em papel americano ou alemão, ganha pouco, mas recebe.

Sabe-se também que o movimento das bolsas e do câmbio no imenso mercado mundial se reveste de um nervosismo constante, caracterizado por uma roda viva de sobe-e-desce, na qual os mais informados ou espertos disputam quem ganha mais.

O mercado, embora global, é formado por um pequeno grupo de craques e um grande número de patos. Lance alguns grãos de milho na direção de patos num parque. Eles virão bem pertinho de você. Quando estiverem comendo, escolha um e o atinja na cabeça com um bastão. Ele ficará inerte. Pode colocar na cesta para fazer um arroz.

Os outros fugirão, apavorados. Um minuto depois, apenas um minuto, jogue mais milho. Os sobreviventes voltarão. E aí começa tudo de novo. Por aqui, neste Brasil varonil, quem comprou boi gordo levou uma pancada dessas. Lançar um papel no mercado com generosa cobertura publicitária e prognósticos fabricados rendeu muito dinheiro a alguns e prejuízos para milhares.

Imagine quatro grandes instituições financeiras (bancos e corretoras, ou ainda fundos, corretoras e bancos, ou alguns madoffs da vida), cada um quinhentos milhões de reais, combinando, com inteligência e refinados cuidados, um plano de manuseio do mercado para ganhar muito dinheiro. O objetivo seria apenas ganhar 1% por semana, para não levantar suspeitas ou invejas. Comprar dólar ou vender uma determinada ação, com objetivo de fazer um lado subir, comprando, e outro perder valor, vendendo, em movimento combinado com técnica aprimorada e profissional, dará sempre o resultado sonhado. Não precisa quebrar a cabeça para saber quanto ganharão por ano. Se agregar juros compostos lucrarão mais de 70%. O mesmo aplicado em Nova York, Zurique ou Londres vai render, no máximo, 2% por um ano. Se aplicar no Japão, perde-se 1%. Já viram como compensa? Se a CVM desconfiar de algum mal feito vai iniciar um processo. Longo. Demorado. E quando chegar o resultado, certamente, parte dos players já pode ter mudado de campo.

Saber usar ou influenciar a volatilidade da moeda, por exemplo, pode trazer lucros de grande monta, embora imperceptíveis. Se um cliente precisa transferir cem milhões de euros para investir no Brasil, escolher a data do fechamento do câmbio é importante. Amanhã pode ser melhor do que hoje. Basta o real valorizar e o investidor receberá mais reais, pelos mesmos euros. Mas, se ao contrário, o cliente precisar enviar o mesmo valor como dividendos para a matriz, é melhor o real se desvalorizar, pois precisará de menos reais para mandar os mesmos euros.

Se a FTC (Federal Trade Comission) americana, dispondo das ferramentas de controle de última geração, pega, com dificuldade, alguns truques aplicados, imaginem como a nossa CVM, contando apenas com a qualidade de seu pessoal e poucos recursos, identificará, para prevenir e punir, os intricados movimentos e seus beneficiários.

A vontade de ganhar, o medo de perder, a intermediação lucrativa, a expectativa do que vai acontecer, o acompanhamento dos balanços, os movimentos políticos, as informações privilegiadas, tudo junto, forma uma atividade onde a capacitação bate a sorte, de longe.

Quem quer participar deste mercado e garantir ganhos e prevenir o futuro precisa entender as dificuldades. Pode fazer até uma comparação com quem quer ser jogador de futebol. Tem que ter habilidade, treinar muito, ter bom técnico e, se acreditar, contar com Deus.

Antenor Barros Leal
Grande Benemérito da ACRJ