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Corrupção vai solapando a retomada econômica

Corrupção vai solapando a retomada econômica

Artigo do conselheiro Fernando Cariola Travassos (*)

Fixando-se na corrupção econômica somente, dentre as muitas formas em que ela se apresenta, vemos que se trata de um problema que assombra o ser humano, fruto de sua capacidade de mentir, de dissimular, em meio ao seu instinto competitivo. No entanto, algumas sociedades conseguem domar tal conduta, enquanto outras, mais complacentes e incompetentes, assistem suas economias serem contaminadas em detrimento da melhoria das condições de vida de seus cidadãos.    

A organização Transparência Internacional (transparency.org) elabora um índice de “Percepção da Corrupção” utilizando indicadores construídos com dados coletados dentro e fora de cada país, via entrevistas com executivos e agentes públicos e privados. Esse índice varia de zero para países percebidos como totalmente corruptos, até 100 para aqueles percebidos como livres de corrupção.

Evidentemente, não há países com “nota” 100, havendo notas de 82 a 90 para aqueles menores geograficamente, com pouca disparidade de renda, menos populosos, além de possuírem um nível médio de educação elevado. É o caso de Cingapura, Dinamarca, Finlândia, Holanda, Noruega, Nova Zelândia, Suécia e Suíça.

Há países complexos e diversificados, com população numerosa e heterogênea, com índices entre 70 e 80 como Grã-Bretanha, Alemanha, Estados Unidos, Japão e França, níveis bastante superiores aos de Brasil, Índia e China com índices entre 30 e 40. 

Os números falam por si, sendo o primeiro índice relativo ao ano de 2014 e o segundo de 2019: Alemanha (79, 80), Grã-Bretanha (78, 77), Japão (76, 73) França (69, 69), Estados Unidos (74, 69), Chile (73, 67), Portugal (63, 62), Itália (43, 53), China (36,41), Índia (38, 41), Brasil (43, 35), Rússia (28, 27).

Os recentes casos de corrupção descobertos no período 2014-2019 contribuíram para aumentar a Percepção de Corrupção no Brasil. A Itália, que vinha de uma reação ao movimento anticorrupção, como o que ocorre atualmente aqui, melhorou sua imagem, após redução parcial das forças corruptas comprometidas com o judiciário daquele país. 

Em 2020 no Brasil destaca-se o desvio de recursos públicos destinados à saúde, em plena Pandemia do COVID 19, inscrição fraudulenta de “cidadãos” para recebimento de ajuda social, somado à dificuldade e leniência em punir infratores, amparados por um intrincado sistema jurídico-processual, foros privilegiados e toda sorte de subterfúgios, legais e ilegais. Adicione-se também o desmantelamento do ânimo contra a corrupção, em vigor em várias esferas do poder, comandada pelos que devem à justiça. Consequentemente o índice do Brasil será inferior em 2020, o que dificulta a atratividade de investimentos internacionais para o Brasil por empresas e fundos de boa reputação. 

De fato, desde 1977, as pessoas e empresas americanas, bem como as estrangeiras listadas em bolsa nos Estados Unidos, estão sujeitas à Lei de Práticas de Corrupção no Exterior (FCPA – Foreign Corrupt Practices Act), que pune suborno e corrupção a funcionários públicos no exterior. Tal lei foi incorporada e ratificada pela OCDE, organismo do qual o Brasil almeja participar como membro pleno. Nossa lei, No 12.846 de 01de agosto de 2013, inspirou-se no FCPA, embora saibamos que no Brasil não há ausência de leis.

Não bastassem as dificuldades nas áreas ambiental e de política internacional, agora teremos mais um flanco de estigmatização. Virão investir no Brasil os chamados aventureiros, sem escrúpulos em suas práticas no país alheio, cotando ofertas abaixo do mercado nas concorrências, para depois lançarem mão de aditivos contratuais.

O abandono do esforço de combate à corrupção no Brasil, além de prejudicial à sua imagem moral no exterior, dificulta também o seu desenvolvimento econômico, devido à falta de segurança jurídica por parte de agentes econômicos nacionais e estrangeiros, atraindo elementos desonestos, acostumados com a ilicitude e a impunidade no ambiente de negócios. 

(*) Artigo publicado pelo membro do Conselho Empresarial de Políticas Econômicas da ACRJ, Fernando Cariola Travassos, originalmente no Jornal A Folha de SP, dia 16/10/2020