Por Mauro Wainstock, membro dos Conselhos Empresariais de Cultura e Varejo da ACRJ
As incongruências que permeiam o universo corporativo são tantas que me vi compelido a listar algumas delas neste artigo. Que este texto sirva para provocar reflexões nas lideranças e as faça agir.
– Turnover nas alturas: a fuga de talentos.
Estudos revelam que o Brasil é um dos países com o maior índice de turnover. A incessante rotatividade de colaboradores assola as empresas e se transforma em um ciclo vicioso que parece não ter fim: insistir nas mesmas abordagens trará os mesmos resultados frustrantes. Urge encontrar soluções disruptivas, imergindo nos anseios genuínos dos colaboradores. Essa mudança de perspectiva não apenas estancará a sangria financeira que as empresas perdem com o turnover, mas também impulsionará a produtividade, fortalecerá o senso de pertencimento e reforçará a marca empregadora, um ativo intangível de valor inestimável.
Neste sentido, a pergunta que ecoa é: como trilhar esse novo caminho?
Não é a pergunta que vale milhões, mas a resposta que propicia um significativo ganho econômico: a educação estratégica.
Um profissional sensato, que vislumbra oportunidades concretas de ascensão e, por conseguinte, de crescimento profissional, teria razões para buscar novos horizontes se a empresa oferecer como benefício o pagamento de sua formação acadêmica? E se esse investimento, além de contribuir para a manutenção do colaborador na empresa, ainda gerar um retorno financeiro? Estudos de caso brasileiros demonstram resultados extremamente positivos, de no mínimo duas vezes o capital aplicado no final do primeiro ano.
– “Reter colaboradores”: uma “prisão atrativa”?
Ao buscar o significado da palavra “reter”, encontrei a seguinte definição: “manter algo, não permitindo que seja liberado”, com o complemento de que “impedir alguém de sair de determinado local, como uma ação policial”.
É essa a imagem que as empresas desejam projetar, a de carcereiros de talentos?
Prefiro adotar termos mais inspiradores e alinhados a uma gestão humanizada: cultivar o engajamento e fidelizar talentos. Essas expressões evocam cuidado real, capacitação contínua e uma relação de ganha-ganha, muito mais condizente com o que se espera de um ambiente de trabalho saudável e produtivo.
– Grupos de afinidade ou bolhas de diversidade: a cilada da segregação.
A diversidade se manifesta nas múltiplas facetas de cada indivíduo. A verdadeira força reside na conscientização da importância da interseccionalidade e no poder da colaboração genuína. A inclusão não é um mero item de marketing ou do ESG, mas um imperativo para a inovação e o crescimento sustentável.
Fragmentar pessoas em “blocos” estanques ignora a riqueza da experiência humana. Como aprofundar o conhecimento sobre as diversas perspectivas e necessidades se a comunicação é direcionada exclusivamente a quem já possui “lugar de fala” e exclui os demais da conversa? A construção de um ambiente verdadeiramente inclusivo exige a quebra dessas bolhas e o fomento de um diálogo aberto e transversal.
– O fator idade: a postura corporativa vai muito além do cronômetro biológico.
O ano de nascimento de um profissional define seu potencial? Ou isto está atrelado ao comportamento proativo, às habilidades atualizadas, ao conhecimento sedimentado, ao talento adquirido, à maturidade conquistada, à experiência vivida, à entrega consistente de resultados, à ética e valores? Estes não deveriam ser os verdadeiros pilares das avaliações?
Qual a lógica de prejulgar o potencial de um candidato com base exclusivamente em sua geração, negligenciando as qualificações intrínsecas exigidas para a função? Essa miopia pode custar caro: empresas que ignoram profissionais com mais de 40 anos perdem a oportunidade de contar com alguém que já vivenciou diferentes cenários e crises, contribuindo com uma perspectiva valiosa e, de acordo com os dados do Ministério do Trabalho, que tem muito mais lealdade à empresa.
– A Ilusão dos 40 anos: barreiras invisíveis ao talento maduro.
Estudo da McKinsey & Company revelou que 50% dos recrutadores hesitam em contratar candidatos com mais de 45 anos.
Reproduzo abaixo depoimentos de Milton Beck, diretor-geral do LinkedIn para América Latina e África:
“Não somos nós que precisamos nos encaixar em empresas que determinam um prazo de validade para os talentos – são elas que perdem por não enxergar esse potencial. O mercado ainda subestima o valor da senioridade – e isso não deveria ser aceitável”.
“A experiência deve ser vista como um ativo valioso. O futuro do trabalho não pertence apenas aos mais jovens, mas sim àqueles que continuam aprendendo, se reinventando e contribuindo, independentemente da idade”.
A conclusão é inegável: a mescla de gerações, a riqueza de opiniões, as variadas bagagens de vida e as distintas formas de pensar enriquecem o debate, tornando os insights mais robustos e, consequentemente, o surgimento de soluções mais viáveis, ágeis e lucrativas.
No complexo labirinto do mundo do trabalho, outros paradoxos também nos desafiam:
– Bem-estar versus carga de trabalho exacerbada: A busca incessante por produtividade a qualquer custo, traduzida em jornadas extenuantes e metas irreais, mina a satisfação, exaure o corpo e a mente, e paradoxalmente, derruba a produtividade em longo prazo. Empresas com programas de bem-estar robustos reportam uma redução de até 28% no absenteísmo e um aumento de 20% na performance (dados da Harvard Business Review).
– Exigência para a vaga versus início da carreira: Exigir experiência de quem está no alvorecer da carreira é um contrassenso. É imperativo que as empresas assumam o papel de catalisadoras do aprendizado e do crescimento desses jovens talentos, abrindo as portas para o futuro do mercado. Programas de trainee e estágio bem estruturados podem gerar um retorno sobre o investimento de várias vezes o valor aplicado.
– Inovação como mantra versus resistência à mudança: A ânsia por vanguarda e inovação esbarra, frequentemente, na morosidade de processos burocráticos. Em um ambiente tecnológico e dinâmico, a agilidade é um diferencial competitivo crucial.
– Produtividade como foco versus reuniões intermináveis: As trocas de ideias, as avaliações de desempenho e as métricas são ferramentas valiosas, mas o formato e a frequência das reuniões precisam ser repensados para otimizar o tempo e impulsionar a performance.
– Flexibilidade do trabalho remoto versus controle exacerbado: A adoção do modelo flexível de trabalho, que pode reduzir custos operacionais em cerca de 30% (Global Workplace Analytics), muitas vezes vem acompanhado de práticas de monitoramento excessivo, que corroem a autonomia e a confiança dos colaboradores.
E você, já se deparou com alguma dessas intrigantes contradições no seu dia a dia profissional?

palestrante e consultor sobre Turnover e
Comunicação Intergeracional e coautor de livros