Por Reinaldo Paes Barreto, membro do Conselho Empresarial de Cultura da ACRJ
Quando D. João VI chegou ao Rio, acompanhado da família, de praticamente toda a Corte de Lisboa e cerca de mais 15 mil portugueses, em março de 1808, o Rio parecia uma cidade oriental antiga. Confusa, mal cheirosa, com uma infraestrutura péssima, e uma paisagem humana feia: mulheres sentadas no chão fazendo cestos, ou vendendo pequenos objetos de artesanato, e escravos africanos seminus transportando gente, dejetos e pequenos animais. O Rio contava cerca de 46 ruas desalinhadas – e muito sujas. Tudo somado, perto de 50 mil habitantes.
Comia-se na rua, em precárias pensões ou junto às charretes que carregavam cestas e panelões fumegantes. Ou na clássica trilogia do três C – Casa, Caserna, Convento.
Com a chegada da Família Real começaram a surgir melhorias imediatas: praças, chafarizes jorrando água, um intendente fazendo as vezes de prefeito e chefe de polícia, pensões e oferta de PFs. Mas o Rio-Gourmet nasceu bem depois, a partir de 1861, quando o Barão de Mauá inaugurou a primeira Fábrica de Gás. E por que? Porque ao contrário da alimentação no sentido estrito, cuja função é apenas saciar a fome e mover a máquina do organismo, a gastronomia é um prazer plural e compartilhado. E com a noite iluminada à lampiões de gás (sem depender do “timing” das toras de lenha), o Rio passou a receber à noite. As mansões do Cosme Velho, de Laranjeiras, de Botafogo, do Flamengo e da Glória, começaram a reunir amigos e familiares para jantares regados a cerveja preta portuguesa, vinho do Porto, vermute e licores franceses. E surgiram os saraus: declamava-se poemas traduzidos de Vitor Hugo, Musset, Verlaine, Mallarmé, e as moçoilas mais prendadas tocavam piano e vertiam lágrimas quando os versos eram tristes…”O Rio civiliza-se”, escreveu João do Rio.
O dinheiro circulava: os Barões do Café já não mais guardavam dinheiro nas fazendas (daí o respectivo ministério chamar-se “da fazenda”), e surgiram os bancos (além do BB, o BCRJ e o BBM) e casas que ofereciam empréstimos e penhores. Nesse cenário que despontou a extraordinária figura de Irineu Evangelista de Souza, mais tarde Barão de Mauá, o maior empreendedor do século XIX brasileiro: um visionário com os pés no chão – e o dinheiro no bolso!
Da pequena fundição na Ponta da Areia, em Niterói, veio logo depois um estaleiro no mesmo local; seguiram-se as companhias de nível internacional. Graças aos empréstimos ingleses, o infatigável empresário e banqueiro criou a indústria naval no Brasil, a Cia. Fluminense de Transportes, a Cia. de Navegação da Amazônia, a Cia. de Iluminação a Gás já referida, o Banco do Brasil, a Estrada de Ferro de Petrópolis, o Banco Mauá em Montevidéu (ele foi dono de quase todo o Uruguai!) e a Empresa San Paulo Railway (a futura Estrada de Ferro Santos-Jundiaí ) e alguns negócios financeiros. Mas o sucesso é perigoso: o Barão mudou-se para a Quinta da Boa Vista, vizinho do Imperador, e um de seus biógrafos, o Jorge Caldeira, nos conta que da sua varanda ele controlava quantos coches com visitantes estacionavam no entorno do Paço de São Cristóvão, e disputava prestígio com D. Pedro II. Infelizmente, perdeu o jogo e faliu. Mas essa a história menor, que não cabe neste artigo.
Pois bem: para celebrar os 215 de criação da Associação Comercial do Rio de Janeiro, feitos em julho agora, e chamada por analogia “A Casa de Mauá”, o atual presidente Josier Vilar, outra “máquina” de iniciativas que movimentam a economia criativa do Rio e do estado, decidiu organizar o Forum Rio Empreendedor, nos dias 4, 5 e 6 de setembro próximo. Será uma prospecção-radar da complexidade das soluções e dos desafios de que necessitamos de olho no relógio para compor uma agenda positiva e propositiva, a fim de que o Rio recupere o seu um lugar de “locus” ideal para se empreender, para se viver, trabalhar, ganhar dinheiro, descansar e/ou se divertir.
E a materialização desse bom paradoxo, será a presença em 3D de um avatar criado especialmente pela empresa Euvatar, uma pioneira no gênero que já gerou 10 protótipos e é referência internacional, e que estará “habilitado” pela IA a responder às perguntas de vários debatedores que irão indagar do visionário Barão como ele enfrentaria a problemática da segurança, da influência das milícias/PCC, dos “nem-nem”, do desequilíbrio de gênero em termos de empregabilidade, do preconceito de certos moradores dos bairros nobres com a presença das periferias nos espaços comuns e, enfim, da humanização dos chatbots que mandam mensagens de aniversário do tipo “ não me esqueci de você”!!!
Quase chorei de emoção.